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27 de nov. de 2010

Saudade daquela mentira

Cresci ouvindo dona Silvia dizer que mentiras têm pernas curtas!
Vez ou outra eu torcia que a mentira pudesse dar um passo mais largo.

_ Não mãe, não fui eu que quebrei o vaso.

Não sei se era a mentira que tinha realmente as pernas curtas, ou, se dona Silvia era que tinha passos largos, não importa, a verdade sempre dava o ar de sua graça.
E eu? Eu tinha meu bumbum como centro de testagem do couro da lepe-lepe.
Não entendia o porquê de tanta indignação, o vaso nem era tão caro.
Nem sabia o que era hipocrisia, mas mesmo assim achava o comportamento dela hipócrita, quantas e quantas vezes ela disse que o machucado não ia arder ao passar o mertiolate? Quantas vezes ela me impediu de sair correndo na rua à noite, dizendo ter um bicho papão na esquina? E quando me fazia tomar emulsão Scott dizendo que era gostoso? 

_ Sua mentirosa, não gosto de você. Você mentiu pra mim.

Nem podia imaginar que um dia eu sentiria falta dessas mentiras, nem muito menos que agradeceria aquilo que acreditava ser hipocrisia. Pasmem! Eu sinto saudades, saudade daquela mentira tão verdadeira da época de infância. Ah, se eu soubesse...

_ Obrigada mãe por não me deixar mentir, e principalmente por ter mentido pra mim.

Nada de entrouxar o bico, oh! Imaculados. Defendo sim as mentiras, não as que eu usava para fugir da lepe-lepe, mas as mentiras verdadeiras de minha mãe. O mertiolate ardia, mas sarava meu machucado; na esquina não tinha bicho-papão, mas eu não fui seqüestrada, atropelada; emulsão Scott não era nada saboroso, mas auxiliou no meu desenvolvimento físico e na minha lindeza (a parte da lindeza é mentirinha rsrs).

Agora as mentiras de adultos para com adultos, essa sim eu repudio.

Amizade de toda a vida, que dura apenas um ano letivo; declarações de paixão que naufraga na primeira discussão; a melhor profissional que se substitui após alguns atestados médicos; o você é linda, que não sobrepuja os primeiros cinco quilos a mais na balança; foi ela(e) proferido no lugar do eu assumo; as lágrimas derramadas sem emoção; divorcio-me de todo faz de conta que me é imposto subliminarmente, que me fez sorrir ontem e tornou-se responsável pelas lágrimas que derramei hoje.

Pena que minha mãe não mais me diz:
_ Filha não gosto dessa sua coleguinha.
_ Vai comer o que eu quero, está ouvindo?

Eu estava segura...

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